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terça-feira, 30 de novembro de 2010

Quem sabe por onde fica o céu

Quem sabe por onde fica o céu? Eu estive lá e conheci o céu de perto.
O céu tem a pele macia como nuvem. Olhos castanhos e sobrancelhas de palhaço triste.
O cheiro do céu é bom, o gosto é doce. Lá é bom de dormir.
Eu sei onde fica o céu. Estive lá. Mas não sei se acordada ou em sonho.
O céu é traiçoeiro, tinhoso. Provoca delírios que não te deixam lembrar o caminho.
Quem foi não consegue voltar. Quem voltou nunca mais vai ver o céu tão de perto.
Mas eu lembro bem. Lembro da íris dilatada do céu quando me olhava.
Sei que era verdade, ainda que fosse ilusão, ainda que em sonho.
Lembro do afago do céu no meu cabelo, e da sua mão em meu rosto.
Gostava quando ele me beijava nos olhos e passeava comigo de mãos dadas.
Sei que era verdade o sorriso do céu.Há quem consiga uma segunda chance de chegar até o céu. Eu fui lá uma vez, uma única vez. E esta será minha verdade pra todo o sempre.

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Salivas

Acordo ácida para banhar minha boca em um copo d'água
Gole a gole, misturo-me. Desço goela, garganta abaixo
Mmal instalada, fico alí bem no estômago - Aguardo digestão.
Descobri uma coisa sobre mim: Rumino ao pensar na sua saliva, na minha.
Sobe quente até a boca o que chega queimando o coração e maltratando a alma
E enquanto aguardo, penso só na sua saliva molhando meus poros altos - e baixos
Lambendo tetas , chupando o lodo sobreposto em minha seda descascada
Juntando a minha e a sua. Ácidas salivas.

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Vergonha

Envergonhada, finjo ser o que não sou
Envergonhada de mim, imprestável, emprestada
Desmotivada, ergo a cabeça, nariz para o alto
Mas somente por pirraça, de ruim, de raiva
Por dentro e pela verdade, dilacerada, transtornada

Nó na garganta, náuseas, vespas famintas no estômago
Que vão adoecendo minhas tripas, ensanguentando meus rins
Vergonha, muita vergonha.
E vou fingindo existir.

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Irrelatável

Sabe, queria ser dessas que escrevem assim. Escrevem com amor. Eu até que, uma vez – ou outra perdida – discorro palavrinhas. Decentes, até. Mas não são poemas, nem músicas, nem canções. Nem nada que fique, que transforme, nada que seja importante, ou que transtorne. Boto pra fora somente um pensamento, destes que são tão bobinhos que a gente nem tem pra quem dizer.
Sempre quis escrever sobre um monte de coisas que nunca escrevi. Declarei amores que não sensibilizou nenhum compositor. Chorei lágrimas que nunca viraram filme de holywood, e quem dirá novela das oito. Me apaixonei loucamente, mas nada shakespeariano, nem digno de um Romeu e Julieta.
Nada que eu escrevi saiu daquele extenso contexto espaço-tempo que somente o meu eu tem acesso. Talvez, e talvez muito com certeza, eu nunca haja aliterado nada suficiente. A minha insuficiência em elaborar não é exatamente a insuficiência em arder, mas em explicar como produzi o fogo. Pouco vocábulo para transcrever? O que é o meu socorro. Não que eu não sinta. Não! Sinto de amor e de dor o tanto capaz de rasgar entranhas, carne. Mas não consigo relatar. O irrelatável.

Eu não vou para o Galo

É Sabado de Zé Pereira e eu não vou para o galo
Hoje é dia de Olinda, Manguebeat
Hoje é dia de ir sem fantasia,
de se enfeitar de lama, e de urucum
Bem no Largo de São Bento

E de ladeira em ladeira, de percursão em percursão
Contemplar, agradecer, festejar
Pra sentir tem que nascer, arder, corar
Tem que vir com frevo no sangue

Tem que subir ladeira com o prazer de se nascer
E Olinda explode, surta, surfa no mar de gente que a gente , engole
E o sol a rachar, esquentar a alma, o sonho, a graça

E passar pelo amparo, quatro cantos e Ribeira,
13 de maio e Praça do Carmo
Subir a sé com frevo no pé

Pra sentir tem que nascer
Pra saber o prazer de sentir o suor descer
E cada gota que escorreu pela espinha
Foi um frevo rasgado, uma alegria.

Desacreditada

Desacreditada, ainda que esforçada
Nunca me foi suficiente
Sempre desacreditada, medíocre, ínfima
Sempre na medida, que me faz sentir menos.

E odeio. Posso ser igual, melhor
Mas nunca suportei a dor de ser menor
De ficar a margem, Na aba

Na tentativa de ser ótima
consegui somente ser regular


Matei. A mim.

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Divagando

Sabe, tem vezes que a gente acredita. Mas acredita muito, bota fé que, desta vez, é a última. E a certa.
Sabe que em momentos felizes a tendência é fechar os olhos para o que tire essa felicidade.
Sintonia?
Nem sempre.

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Carne Crua

Quando tua voz turva cruza minha alma
Que meus ouvidos adormecem, de dormentes
E nenhum outro som, a não ser o ofegante
desperta meus sentidos

E se depara com a boca doce de ameixa
Que esfrega a minha, quase deixando as marcas da tua barba
E eu adoro
me abro
me arreganho



Sorrio, Bulindo
Amassando meus, teus poros
Como fosse tão pouca pele
Sem divisão, sem limitação

E suspiro com teu gosto de erva
Que, a mim, causa delírios e sonhos
Que, a nós, causa odor
Odor de gozo
subindo à goela

Crua, como carne de açougue
Abatida,Devorada
E de olhos abertos, vendo tudo
até tua irís sumir entre as pálpebras

Gosto disso
A linha tênue
Amor puro
E perdição plena

Comer você te amando
Amar você te comendo
Viciada
Dia,Noite

E esperar o relógio
E me deleitar outra vez

terça-feira, 31 de agosto de 2010

Defeituosa

Sabe, o esquecimento é como um frio que dá bem na ponta dos dedos. Destes que a gente põe a mão entre os cabelos e encosta no couro cabeludo por trás das orelhas pra esquentar. Não tenho vontade de morrer, de verdade, nunca tive. Mas, por vezes, engraçado...ela aparece.

Normalmente, é justamente quando me surge este frio na ponta dos dedos. É neste mesmo período que me vejo nervosa, impaciente e impulsiva. Uma espécie de pomba-gira do novo século, que, inconstante, deve cumprir as tarefas ainda que à beira de cometer qualquer que seja o homicídio, merecedor ou não.

Alguns momentos também me brotam lágrimas nos olhos. Ora, se eu não sei o que fazer? Assim, eu choro. Como criança entre a pipoca e o pirulito.

No meu estômago, vespas. Vespas zumbantes e inquietas, que vagam de um lado para o outro se estabacando a cada segundo em uma das paredes dentro de mim. E normalmente, quando tentam subir pelo canal da traqueia, sobe-me aquela vontade. Vontade de vomitar vespas barulhentas.

E aguçada, sinto meus fios de cabelo separados uns dos outros. E as pontas duplas se abrindo, uma a uma. E parte deles caindo, um, depois o outro, um depois outro, como não fosse mais restar nenhum.

Ignorada, nem te mereço, acredito. Penso nos meus pés descalços e nas minhas unhas mal pintadas e vem a certeza: de fato, não te mereço. Não mereço nada, defeituosa que sou eu. Mentalizo barulhos de passáros e caminho dia após dia em busca de descobrir como cessar frios, mortes, lágrimas e vespas zumbantes. Mas não consigo. Não consigo. Defeituosa, sou eu.

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Querer

Quero teu sorriso
O teu olho fundo
Teus rosto fino
Teus braços largos

Quero teu peito aberto
Tuas mãos fortes
Teu abraço enorme
tua alma

Quero teus cabelos de volta
teus dentes tortos pra sempre
Teu cheiro de talco jonhson & jonhson
Teu hálito de ganja por vezes em vezes

Quero tua neurose
Quero ser tua cura

Quero você despido, suado
pingando
zonzo
Ou até você sério, com a camisa abotoada

Quero você quando me dá órdens
e também quando me pede conselhos
Quero você indeciso
da vista marejada
Atordoado

Quero você me pedindo pra ficar
me pedindo pra te amar

Quero tua voz cansada, falha, gaga

ou sonora

Quero teu pesar, mas também teus agudos
Quero acordar contigo
E não dormir nunca mais

By Manuella Bezerra de Melo

sexta-feira, 30 de julho de 2010

Umbilical

Despedaçada.

Corpo mole, que sangra. Frio, ranço, beleza derretida. São quilômetros infinitos daquele perfume de lavanda que descabelam a alma de abstinência. O cheiro que vicia. O sorriso de trela que rasga de ponta a ponta a carne viva pulsante por uma medida de dentes à mostra.

A voz aveludada e doce que canta de madrugada, louca, e sonha por um toque.
Ligações umbilicais.

Pouco de estar vivo não é efêmero.

quinta-feira, 29 de julho de 2010

Atemporal

Quando tempo se deve dar ao coração?

Sussurro, suspiro, exalto. Penso, dispenso, repenso. Angustio, ligo o ‘foda-se’. Passo à frente. Passo atrás. Ora, ora. Alguém me diga, por favor! Quanto tempo deve se dar ao coração?

Atemporal. Músculo atemporal. E nem me venha com este negócio de que amor é algo que vem do cérebro. E nem me venha com esse negócio de tempo, quando o problema, na verdade, é a satisfação ao planeta.

Eu bem que gostaria. Bem que pedi. Bem que tentei.

Mas, atemporal, meu coração não quer saber de convenções. De padrões. De churumelas. De mi-mi-mí e padronagem que nem me deixam escrever tão direta o tamanho da felicidade que me trouxe a atemporalidade do meu coração.

E eu sigo amando. Surpresa, cativa. Ganhando cafunés e sorrisos da novidade boa e inesperada que me trouxe a vida.

Fraqueza

Bateu na fraqueza.
A sensação era de um ‘pós-rabada’ com cerveja.




Destas que você quer mesmo uma rede e um ventinho no rosto, um cochilo e um cafuné.

domingo, 25 de julho de 2010

A SAGA DE UMA QUARTA-FEIRA SURREAL...

Por Isadora Dias (www.twitter.com/paz_profunda)


Quarta-feira
chamada ao fone
sim
não...
não não.. sim!
sim...!

Chuva..
É chuva....
Chuvaaaa....!!!!

Sim, ganja, gatinhos, sim...
Não, e aí? Aí?
Aqui?
Ah, aqui....
Aqui! Chegou.

Ui! Sem dinheiro. Banco!
Onde?
Aaaiiiii......
Moço... onde?
Lá... Lááá em Boa Viagem!

Ã?
Vá encher o cu de palito!

Ok, Bultrins, 0h.
O transito parado.
PA-RA-DO
Engarrafamento na madruga de Olinda.

No paliozinho...
Rodrigo y Gabriela
E fotos!
(a alegria vem de dentro...)

Então... mágica!
Tudo livre
Posto, banco livre!
Bexiga, agora livre também...

Baiana, xinxim
Coco de umbigada...
Forró rabecado

Era um jardim...
Dança do acasalamento?
Como assim????

E, por fim,
a libriana comtempla
E elogia
O foco de quem é eternamente
Virgem

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Não sem dor

Tudo mudou


A decisão partiu de mim
Mas não sem dor


Dilacerado o meu coração segue
Aprendendo a viver incompleto
Na tentativa de mutação pra resgatar a carne que falta

Libra
Que me ensinou a pesar
Talvez seja grande culpado
Na balança sentimento
Na Balança racionalidade

E o meu eu ambíguo, paradoxal
Quase bipolar
Berrou

O que é melhor
Ou o que é pior
Quem vai saber

E de que importa
Se já é feito, decretado
Carimbado
Autenticado

Pra mim também
No âmago, bem que é


Mas não sem dor

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Pessoinha




Quietinha, estava eu.

Gozante de minha plena e arrodiada pós-adolescência.

Duração eterna, eu previa.

A vidinha igual a sempre trazia todas e nenhuma novidade do mundo.
Liberdade cativa.


Daí, pow! A notícia:

- Tem alguém morando em você.
- Como assim morando em mim, doutor?
- Isso mesmo. É uma pessoinha. Se alimenta do que você se alimenta. Ouve o que você ouve. Sente o que você sente. Tem alguém morando em você.

Volto pra casa desolada. Era felicidade também. “Que incrível. Que poderosa sou eu, que posso gerar até vida?”
Mas eram tantas rugas. Rugas de dúvidas. E nenhuma iria ser retirada Dalí antes do tempo certo.

Resolvi esperar. Uma hora, a tal pessoinha ia querer responder minhas perguntas.

- “Tem alguém aí?”, falava eu com a barriga – ou seria com a pessoinha - , sem retorno.

Quando muito, a resposta eram horas a fio de enjôo e cabeça enfiada no vaso. “Acho que ele não gosta tanto de Nutella quanto eu”, pensei.

Aí o tempo foi passando. A barriga foi crescendo. Eu estava no caminho certo. ‘A pessoinha’ estava crescendo. E forte, segundo o médico, que vez por outra fazia um filminho dele pra que a gente pudesse verificar a sua saúde.

É tanto tempo com ‘a pessoinha’ morando dentro de você, que na medida que ela cresce, vai crescendo também um sentimento. Destes tão fortes que faz tão bem a gente. Chegou um tempo que achei que ele começou a falar. Queria avisar pra mim que estava ali.

Tolinho. Como se eu já não soubesse, ele chutava sua casinha até que eu pudesse ver o seu pezinho.
Não havia voz. Mas eu sentia que era: -“Sou eu, mamãe. A pessoinha que mora aqui”, que ele dizia.



- A bexiga não, pessoinha. A bexiga, não.

Com a barriga já pela boca, as ancas doíam.
- Ai que dor, seu doutor. Essa pessoinha não está comendo demais?
- Calma, casuolinho. Esta é somente a dor mais fraquinha que você terá.

Em poucos dias, entendi. Como aquela pessoinha iria avisar que queria sair Dalí? Era aquela a dor que dizia que aquela casinha já estava pequena demais para a pessoinha.

- Vejam, vejam. Chegou a pessoinha.

Como eu estava feliz. Meu coração tinha o dobro do tamanho, agora. Meio desengonçada, era tão curiosa em saber seu rostinho, que apareceu, todo enrugadinho, avermelhado.

- Que engraçado. Ele tem meu cabelo, doutor. E meus olhos caídos também.
- É seu príncipe. Agora você não é mais casuolinho. Agora você é rainha.

terça-feira, 27 de abril de 2010

Enrolada

Amontoa
Assim, feito minhas idéias,
meu cabelo pixainha
Sobrevoa

Quanto mais cresce
Menor fica
Pelos como buracos
Negros em mim
Eu, mulata ou a fim
de ser

Enrolados, como eu
Danada! Como meu
ser vaidoso

Como eu
Espaçosa, descarada
Grandes fios misturados
Me misturando ao mundo
E a me negar a boa educação
Do fino (e liso) trato

Ah, meu cabelo...
Não é por rebeldia
É por ser meu pêlo
Meu belo cabelo

Não por isso, não por conquista,
Por direito e
Por tê-lo, assim:
cabelo, xaxim, pixaim
Cabelo ruim?
Ruim sou eu
Que o levo em cima de mim
e ainda me enfeito
De flores e batom carmim

Ruim é você, pra você!
Que me acha linda
E quer
Ser ao menos metade mulher

Mas debaixo de tanto defrizante,
ainda...

Vai, me deixa
Ser bela!
Já não sou mais aquela
A pensar em certos caimentos
Sociais

Do contrário
A balançar meus cachos impermeáveis
Forteleço o corpo,
a alma,
e a história dos meus ancestrais.

Agora passa e dá uma olhada
Assim, como quem não quer nada
Se envergonha e pensa:
Não são, mesmo, esses negros cabelos
sensacionais?




De Isadora Dias para os cabelos que Deus lhe deu....

Veja mais em www.dadivadeisis.blogspot.com

segunda-feira, 1 de março de 2010

Parte do Mundo de Alice

Deitada à beira da piscina, na única casa murada daquela rua, a menina abria e fechava os olhos bem devagar. O corpo inteiro estava fora dágua. E com os braços, segurava uma flor. Os raios da manhã iam penetrando, doces, na sua pele. E girava, girava, abrindo, por vezes, as pálpebras para assistir as cores.
Enquanto isso, a cabeça, até as orelhas, estava submersa, tapando somente os ouvidos para que ela pudesse ouvir o barulho apenas do silêncio da água.

A cutis era branca como nuvem. Os olhos azuis e os cabelos loirinhos, que balançavam molhados.


Num dia de sol, ela decidiu que tomaria banho de piscina. No caminho, colheu uma papoula cor de rosa tão bonita no canteiro do jardim que seria incapaz de soltar. O sol estava tão gostoso. Indecisa, ela ficou com os três.